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quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Capítulo 3 - O Início


        Eu não me sentia totalmente a vontade perto do Jun, pensava que cada erro que eu cometesse, seja mesmo ao andar, ele iria perceber. Mas lá, eu me sentia em casa. Havia um pátio extenso, a casa tinha uns detalhes em vermelho, agradável ao meu ver.
       Meu avô conviveu pouco com a nossa parte da família—eu, meus irmãos, mãe e meu tio—, sempre foi muito amável e carinhoso, mas viveu distante de nós. Costumava nos ligar uma vez ou outra, e nas datas especiais. De vez em quando ele aparecia de surpresa, de manhã, bem cedo, fardado. Ele vinha e dava um  beijo bem dado em nossas bochechas, e um abraço ao estilo "quebra ossos". Mas por mais que existisse a distância e a pouca convivência, o amor era enorme e nunca mudou.
      Quando ele conheceu meu irmão mais novo, ele tinha ido a nossa casa, e levou até mesmo o Jun junto. Eu tinha uns 5 ou 6 anos. Mas não foi um contato que possa se chamar de "amizade" ou algo do tipo. Jun tinha um semblante fechado, era sério, calado e grudado ao meu avô.
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       Lá na casa do meu avô mesmo que ficássemos somente em casa, havia muitas coisas para fazer, jogar futebol na rua, brincar na areia—existia um montinho de areia para construção, eu brincava com o pequeno Emerson—, mexer no computador, entre outras coisas.
       Meu irmão menor era um tanto falador, o que mais interagia com as pessoas, mas ao mesmo tempo, tinha certas dificuldades para algumas coisas, entre elas, a fala. Também, mesmo sendo pequeno, não se relacionava muito bem com, digamos, crianças mais novas que ele. Pouca paciência era o que ele tinha.
      Meu avô estava o lado de fora da casa, onde havia um pneu pendurado numa área, o chamado ''balanço de pneu''.
—Sobe aí—Disse meu avô para meu irmão menor. 
Sendo assim ele subiu, mas não se equilibrava muito bem, ficava imóvel, temia algo.
—Vamos, balança, deixa que eu balanço isso.—Disse meu avô, pronto para embalar ele ali, mas foi interrompido.
—Não!—Falava meu irmão, em um tom de incomodação.—Não vô.
     Meu avô insistia, mas não adiantava, ele não queria. Tinha medo de cair, ou algo do tipo. De tanto meu avô insistir, ele ficou bravo. Sobrancelhas baixas, bochechas infladas. Quando ele ficava chateado ou bravo, era uma figura, todo mundo achava graça, mesmo que não fosse algo que totalmente engraçado. Virava a atração, e as imitações começavam. Meu avô sorriu, entendeu e parou com a insistência.
       Chegando a noite, estávamos todos de pijama, no quarto do Jun, entusiasmados. Jun provavelmente, mesmo sendo mais velho do que nós, o espírito de criança dele, obviamente estava ali, ele estava alegre. Estávamos eu, meus irmãos, o pequeno Emerson—o neto e o Jun, ali, quietos. Meu avô deu uma olhada e nos deixou ali. Assim que ele saiu, começamos uma guerra de travesseiros, travesseiros para todos os lados, nós ríamos muito, cuidando pra não machucar de verdade, mas se divertindo. As risadas altas, mas de modo que não incomodava. Era um caindo para um lado, outro pro outro e assim ia.
      O pequeno neto do meu avô queria dormir ali no quarto com nós todos, mas o Jun começou a insistir e falar mais ríspido para ele que ele não ia dormir ali. A luz estava acesa e então Jun disse:
—Não tu não vai dormir aqui, eu vou apagar a luz. —Disse ele, fazendo exatamente isso. O pequeno ficou chateado, mas foi-se.
       Continuamos a guerrinha no escuro mesmo. Eu levava cada pancada, não doía, mas eram fortes, principalmente do Jun. E então que começaram algumas coisas curiosas. Continuávamos a guerra, mas existiam alguns momentos em que o Jun me segurava, e colocava seus braços em volta de mim. Eu fingia não me importar, e continuava querendo acertar os outros, mas ele continuava com os braços em volta de mim, e eu sentindo uma sensação estranha, não sabia muito bem explicar, mas ele me segurar daquele jeito foi algo inesperado para mim. Meus irmãos podiam ser chamados de desligados, ou que apenas, não viam nada demais naquilo.
      Tudo continuou, até que, meus irmãos já caíram no sono e eu e o Jun continuávamos a fazer a brincadeira. Apenas nós dois. Eu e ele. Eu sentia que tinha algo no ar. Eu me sentia tão boba, tão estranhamente alegre. A partir do momento que ele não queria mais a presença do pequeno do quarto, eu notei que ele planejava algo.
     Eu ia dormir na cama dele, ele em um colchão logo ao lado da cama, no chão e meus irmãos no mesmo quarto, mas um pouco mais afastados. Eu e ele estávamos perto de certa forma. A brincadeira não havia acabado nem mesmo num silêncio, e no cansaço que eu já estava. A partir de certo momento ele começava a segurar minhas mãos, as duas mãos juntas me imobilizando, na brincadeira, de poder acertar ele. Eu tentava escapar, mas ele não soltava. Eu ria, tentando no escuro achar uma forma de escapar, tentava também, poder enxergar o rosto dele, mas o escuro não deixava.
—O que eu preciso fazer pra tu me soltar? —Perguntei.
—Tente se soltar.
      Eu tentava, tentava mas não dava, eu me mexia sem parar, mas não conseguia.
—Tu precisa ficar mais calma e então eu te solto. —Disse ele.
      Eu respirei fundo e fiquei mais quieta, sem me mover, ele ainda segurava minhas duas mãos. Eu fechei os olhos e achei que ele queria que eu dormisse, e eu fingi que estava dormindo, até respirava mais profundamente, mas não era isso que ele queria. De repente, se antes ele estava segurando minhas duas mãos, naquele momento ele tinha começado a acaricia-las. Minha respiração ficou um pouco mais acelerada, abri os olhos, mas não me movia, apenas sentia que algo iria acontecer. Ele começou a beijar a minha mão e foi subindo pelo meu braço, até alcançar meus lábios. Eu levei um choque no coração, sentia meu coração na boca, e no meu pulso, como se ele estivesse sobre a pele.Eu não acreditava. Estava eu imaginando coisas? Não. Era meu primeiro beijo. Eu tinha 10 anos, ele tinha 15. Ele movia seus lábios nos meus. Eu não sabia exatamente como agir, apenas fazia o mesmo que ele. Era uma sensação boa, eu não sabia como explicar, ao mesmo tempo que me sentia indefesa, aquilo parecia que era exatamente o que eu esperava que acontecesse.
     
     O beijo então parou ele segurou o meu pulso.
—Nossa, está acelerado. —Disse ele.
—É... —Foi apenas o que consegui dizer. Eu estava meio sem jeito.
      Ele então deitou a cabeça no travesseio dele onde ele ia dormir e eu na cama onde eu ia dormir, mas virada para o lado que ele estava. Ele segurava uma de minhas mãos e a acariciava. Eu passava minha outra mão por seu rosto, acariciava como se pudesse vê-lo no escuro, ele fechava os olhos enquanto eu o acariciava. Sua pele causava certo choque nos meus dedos. Um choque diferente, bom. Sua pele suave, quente, seus lábios macios e os olhos...Os olhos. Marcantes.
—Minha mãe sabe tudo mesmo. —Falei, relembrando o que ela havia dito para o meu avô.
Ele riu. Perguntou por quê. Eu expliquei. Logo ele me beijou novamente, mas eu interrompia, porque estava com muito medo que alguém nos pegasse.
—Mas tu tem 15 anos e eu tenho só 10. —Eu falava.
—E daí? Qual é o problema? —Perguntou ele.
       Me senti boba depois de minha pergunta. Mas não fiquei com aquilo na mente.
      Nós conversamos sobre muitas coisas.
—Eu ia dar o meu primeiro beijo nu menino lá da minha rua. Mas ele queria dar um beijo em mim e logo em outra menina também, então eu desisti. —Expliquei. Eu sempre fui assim, não sabia o que era muito bem o "ficar", achava que ele ia ser só meu, mas não, era de várias. Podia ser chamada de cafona, qualquer coisa. Mas apenas ficar e nunca mais ver a pessoa. Não era minha praia. Sempre sonhei com alguém para ficar comigo para sempre. Sonhava, com o sempre.
—E então porque comigo tu aceitou? —Questionou ele.
—Eu não sei. —Menti—E tu?
—Eu gostei de ti desde que eu te vi pela primeira vez. —Disse ele. Eu sabia que ele não disse gostar de um jeito muito especial. Eu tentava não me iludir.
      Conversamos bastante. Até que eu virei meu rosto para o lado e ia tentar dormir.
—Amanhã se pudermos ficar sozinhos.... vamos nos beijar de novo? —Perguntou ele. Era mais um pedido do que uma pergunta.
—Não sei... —O medo—Vamos ver.
      Até eu fechar os olhos, a mão dele não havia saído da minha.


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